Selecionei dois lindos poemas do poeta espanhol, Federico García Lorca.
O primeiro é do livro “Sonetos del amor oscuro”, de 1936 (publicado no Brasil como “Sonetos do Amor Obscuro”). Este livro causou um grande choque cultural na Espanha quando foi publicado em 1984 (quase 50 anos após sua morte), pela revista madrilenha ABC, depois de ter sido divulgado clandestinamente no ano anterior, por conta do tom erótico e dos versos homoafetivos que se tornam mais explícitos na fase mais madura de sua obra.
O segundo, do livro “Diván del Tamarit” (Divâ do Tamarit), que foi publicado também postumamente, em 1940, primeiramente na Argentina e nos Estados Unidos, Revista Hispánica Moderna.
Llagas de amor
Esta luz, este fuego que devora.
Este paisaje gris que me rodea.
Este dolor por una sola idea.
Esta angustia de cielo, mundo y hora.
Este llanto de sangre que decora
lira sin pulso ya, lúbrica tea.
Este peso del mar que me golpea.
Este alacrán que por mi pecho mora.
Son guirnaldas de amor, cama de herido,
donde sin sueño, sueño tu presencia
entre las ruinas de mi pecho hundido.
Y aunque busco la cumbre de prudencia
me da tu corazón valle tendido
con cicuta y pasión de amarga ciencia.
Chagas de amor
Esta luz, este fogo que devora.
Esta paisagem gris que me rodeia.
Esta dor por uma só ideia.
Esta angústia de céu, mundo e hora.
Este pranto de sangue que decora
lira já sem pulso, lúbrica teia.
Este peso do mar que me golpeia.
Esta lacraia que em meu peito mora. .
São grinaldas de amor, cama de ferido,
onde sem sono, sonho tua presença
entre as ruínas de meu peito oprimido. .
E ainda que eu busque o cume da prudência,
me dá teu coração vale estendido
com cicuta e paixão de amarga ciência.
Gacela X
De la huida
Me he perdido muchas veces por el mar
con el oído lleno de flores recién cortadas.
Con la lengua llena de amor y de agonía.
Muchas veces me he perdido por el mar,
como me pierdo en el corazón de algunos niños.
No hay nadie que al dar un beso
no sienta la sonrisa de la gente sin rostro,
ni nadie que al tocar un recién nacido
olvide las inmóviles calaveras de caballo.
Porque las rosas buscan en la frente
un duro paisaje de hueso
y las manos del hombre no tienen más sentido
que imitar a las raíces bajo tierra.
Como me pierdo en el corazón de algunos niños,
me he perdido muchas veces por el mar.
Ignorante del agua, voy buscando
una muerte de luz que me consuma.
Gazel X
Da Fuga
Perdi-me muitas vezes pelo mar
com o ouvido cheio de flores recém-cortadas,
com a língua cheia de amor e de agonia.
Muitas vezes perdi-me pelo mar,
como me perco no coração de alguns meninos.
Não há noite em que, ao dar um beijo,
não sinta o sorriso das pessoas sem rosto,
nem há ninguém que, ao tocar um recém-nascido,
olvide as imóveis caveiras de cavalo.
Porque as rosas buscam em frente
uma dura paisagem de osso
e as mãos do homem não têm mais sentido
que imitar as raízes sob a terra.
Como me perco no coração de alguns meninos,
perdi-me muitas vezes pelo mar.
Ignorante da água vou buscando
uma morte de luz que me consuma.
Traduções: William Angel de Melo, tradutor, ensaísta, escritor poliglota e dicionarista brasileiro, com 58 livros publicados.
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